Os salmos eram o grande hinário da igreja do Velho Testamento, e hoje em dia ainda são cantados nos cultos cristãos. Neles temos, pois, um meio de sabermos como deve ser o culto verdadeiro.
A definição básica de culto nos Salmos é ‘louvar o nome do Senhor’, ou ‘tributar ao Senhor a glória devida ao seu nome’. E ao inquirirmos o que significa o seu ‘nome’, verificaremos que é a soma total de tudo o que ele é e fez.
Em particular, ele é cultuado nos Salmos tanto como o Criador do mundo como o Redentor de Israel, e os salmistas se comprazem em adorá-lo dando uma lista enorme das obras de Deus, relativas à criação e à redenção.
O Salmo 104, por exemplo, expressa a incontável maravilha da sabedoria de Deus em suas múltiplas obras no céu e na terra, na vida animal e vegetal, entre as aves, os mamíferos e os ‘seres sem conta’ existentes em abundância nos mares e grandes oceanos.
O Salmo 105, por outro lado, exalta outro aspecto das ‘obras maravilhosas’ de Deus, a saber, o tratamento especial que dedicou ao povo da sua aliança. Narra a história dos séculos, as promessas de Deus a Abraão, Isaque e Jacó; sua providência para com José do Egito, tirando-o da prisão para a honrosa posição de grande senhor; seus atos poderosos feitos através de Moisés e Arão, enviando as pragas e libertando o povo; sua provisão àquela gente no deserto e o seu poder que fez com que herdassem a terra prometida.
O Salmo 106 repete em grande parte a mesma história, mas enfoca desta vez a paciência de Deus com o seu povo, que vivia se esquecendo de suas obras, desobedecendo suas promessas e se rebelando contra seus mandamentos.
O Salmo 107 louva a Deus pelo seu permanente amor, que vem de encontro às necessidades de diferentes grupos de pessoas: de viajantes perdidos no deserto, de prisioneiros desfalecendo em calabouços, de enfermos à beira da morte, de navegantes apanhados numa grande tempestade. Todos estes ‘na sua angústia clamaram ao Senhor e Ele os livrou das suas tribulações’. Assim, ‘rendam graças ao Senhor por sua bondade e por suas maravilhas para com os filhos dos homens!’
No Salmo 136 o mesmo refrão litúrgico se repete em cada versículo: ‘porque a sua misericórdia dura para sempre’. E as chamadas para render graças ao Senhor por Sua bondade começam com a Sua criação dos céus, da terra, do sol, da lua e das estrelas, prosseguindo daí com a Sua redenção de Israel do Egito, e com os reis amorreus, a fim de dar-lhes Sua terra em herança.
Bastam estes exemplos para mostrar que Israel não cultuava a Deus na forma de uma divindade distante ou abstrata, mas como o Senhor da natureza e das nações, como alguém que se revelara através de atos concretos, criando e mantendo o seu mundo, redimindo e preservando o seu povo. Israel tinha bons motivos para adorá-lo pela sua bondade, por suas obras e por ‘todos os seus benefícios’. A estes poderosos feitos de Deus (o Deus criador e o Deus da aliança), os cristãos acrescentam o ato de Deus ser mais poderoso do que todos os demais: o nascimento, a vida, a morte e a glorificação de Jesus; o seu Dom do Espírito Santo; e a sua nova criação, a Igreja.
Esta é a história do Novo Testamento, e é por isso que tanto os textos do Velho como do Novo Testamento, juntos, com uma exposição bíblica, constituem hoje uma parte indispensável do culto cristão.
Somente quando de novo ouvimos sobre o que Deus já fez encontramo-nos em condições de retribuir-lhe com a nossa adoração e o nosso culto.
É também por este motivo que a leitura e a meditação da Bíblia são uma parte muito importante na devoção pessoal do cristão.
Todo culto cristão, seja ele público ou pessoal, deve ser uma resposta inteligente à auto-revelação de Deus, por suas palavras, e suas obras registradas nas Escrituras.
É neste contexto que, de passagem, se pode fazer uma referência ao ‘falar em outras línguas’. Qualquer que tenha sido a glossolalia no Novo Testamento - se um Dom de línguas estranhas ou a expressão de sons em êxtase - o certo é que as palavras eram ininteligíveis a quem as proferia.
Por isso mesmo foi que Paulo proibiu falar em línguas em público, se não houvesse quem traduzisse ou interpretasse; e desencorajou a sua realização ou devoção pessoal, se a pessoa permanecesse sem entender o que dizia.
Escreveu ele: ‘Pelo que, o que fala em outra língua, ore para que a possa interpretar. Porque, se eu orar em outra língua, o meu espírito ora de fato, mas a minha mente fica infrutífera. Que farei, pois? Orarei com o espírito, mas também orarei com a mente... ‘
Noutras palavras, Paulo não podia admitir nenhuma oração, nenhum culto, em que a mente permanecesse estéril ou inativa. Ele insistiu que em todo culto verdadeiro a mente tem de ser completamente empenhada, de modo a dar frutos.
O prazer dos coríntios para com o culto ininteligível era algo infantil.
Quanto ao mal, disse-lhes para serem como crianças e inocentes o quanto fosse possível, mas acrescentou: ‘no modo de pensar, sejam adultos’.
(Extraído de “Crer é Também Pensar” – de John Stott-)
(Negritos e sublinhados meus –RF)
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