Ele era um jovem de altura mediana e mantinha sempre uma postura ereta e firme em contraste com seu olhar terno e cheio de compaixão. Durante todo o dia trabalhava na oficina, pois era carpinteiro maravilhoso e tinha muitas encomendas. Excepcionalmente, naquela noite ele estava fatigado. Ao crepúsculo, deixou a casa e subiu para a colina. Não havia ninguém por ali, pois era a hora da refeição noturna.
Eu jamais vira o céu tão vermelho como estava então, como se o firmamento se incendiasse. Mesmo as montanhas flamejavam como pedras reluzentes. Todo o verde se confundia mesclando-se em meio a um espetáculo assombroso. Parecia que o céu vinha de encontro com a terra misturando todas as cores jamais vistas.
Não sei por que o segui. Fiquei de pé, abaixo dele na pequena passagem de pedra e levantei os olhos para onde ele estava. Vestido em uma roupa branca parecia uma estátua de pedra contra a paisagem avermelhada em contraste com suas vestes esvoaçantes. Sem se mover era como se esperasse algo. Tão inspiradora de respeitoso temor era a cena de fogo tosco que por um breve momento fechei os olhos e suspirei. Em fração de segundos, quando levantei a vista, vi que ele já não estava sozinho.
Um grande anjo, alto e majestoso, estava em pé diante dele e eu senti que aquele anjo era só maldade embora tivesse um belo rosto. Sombriamente belo. Parecia estar vestido ao mesmo tempo em flama e noite, e suas asas poderosas refletiam o crepúsculo como basalto esculpido.
Ambos contemplavam-se mutuamente em silêncio e meu coração estremeceu de terror ao vê-los assim se defrontando. Falaram algo? Não sei, não vi, não lembro... Lembro apenas daquela cena estática em meio a um silêncio gritante que pairava no ar.
Enquanto os observava à espreita, vi que o anjo abaixou-se e levantou nas mãos um punhado de terra, mostrando àquele jovem que em nenhum momento demonstrou receio diante de tão terrível anjo de rosto belo, doloroso e cheio de orgulho. Esse anjo que, com um riso leve e escarnecedor, tenta mostrar a inutilidade do mundo atirando a terra e pisando sobre ela, ao mesmo tempo em que surge um som semelhante ao de um trovão que parecia vir do próprio anjo.
Então Jesus também abaixou-se. Levantou alguma terra em Suas mãos e, segurando-a ternamente, esfregava-a entre os Seus dedos. Era terra seca e árida, sem verdura e sem cor, mas enquanto Ele a segurava, subitamente floresceu um ramalhete de caule viçoso e espessas folhas verdes de onde surgiam minúsculos lírios que se curvavam delicadamente. Era uma visão tão surreal e ao mesmo tempo algo tão nítido que pude sentir o vento e a fragrância que dele vinha para me inebriar.
O anjo olhou para as flores, recuou e cobriu o rosto com as mãos. Então, desapareceu com um grito tremendo e o jovem ficou sozinho.
Corri descendo o caminho da colina em direção à minha casa e logo depois percebi maravilhada que Jesus vinha também na mesma direção. Ao chegar nada falou.
Simplesmente olhou nos meus olhos... E me abraçou em silêncio.
Foi então que eu acordei.
(Fragmento adaptado de "Médico de Homens e de Almas" - Taylor Caldwell)
4 comentários:
Regininha, que belo texto: poético, sonhador e cheio de símbolos poderosos.
Esse texto já entrou para as composições mais literárias da confraria.
beijos
Me fez perder o fôlego... não há o que comentar! Simplesmente lindo!
Bjs...
JC
Regina, gostei muito também.
E, logo no início, me fez pensar como é isso de descrever Jesus. Porque é sobre isso que estamos falando: quem e como era Jesus? Penso, assim, como escritor, como descreveria Jesus fisicamente, psicológicamente... uhhh! Difícil!
Próxima.
Jesus nos liberta dos nossos fantasmas das mais diversas e inimagináveis maneiras.
Inclusive por meio de livros e de sonhos...
Eita Jesus rss
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